sábado, julho 24, 2004

Cogumelos de Curitiba

Era mais um fim de tarde sem graça e sem sol naquela cidade gelada. Andrea encostou-se no parapeito da janela do meu apartamento, soltou fumaça fazendo biquinho e proferiu a bela frase: "Intimidade é fazer cocô de porta aberta".

Ela me explicava porque ser casada aos 22 anos era "trilegal". Pensamento brilhantemente concluído, tirou de uma sacola o vestido prateado que eu usaria no casamento da vitoriosa dupla do esporte. Como a exuberância de Andrea em mim ficava a desejar, o traje coube quase que perfeitamente, apesar de meus muitos centímetros a mais de altura. Nos pusemos então a fazer o trabalho na mesa de jantar, enquanto o resto do grupo conversava e comia pipoca no sofá, em frente à estante com a televisão (em uma frase cabem todos os móveis do meu hospitalar apartamento na cidade do meu então vizinho Jaime Lerner).

Eu escrevia à mão e Andrea me ajudava a buscar trechos de livros, revistas e jornais. Cumpríamos a insólita função de especular de que forma Pierre Bourdieu analisaria o Programa do Ratinho. Foi minha última e hilariante ousadia em Curititba.

A bela gaúcha, ouvi dizer, se mandou para a França com o marido. Nunca mais soube dela.

Outras figuras do primeiro ano da faculdade de jornalismo me deixaram saudades, entre elas Alexandra, Dani e Carol - de tanto andarmos juntas, ganhamos o apelido de Spice Girls. Carol, a ruivinha, já é mãe aos 23 e tem uma pequena empresa de comunicação, assessoria ou algo parecido. Alexandra, linda, loura e tímida, menina de cidade do interior, era uma boa amiga, que participou dos meus últimos dias em Curitiba, foi à minha despedida, conheceu amigos do vôlei. Não tenho idéia de por onde anda. Já a Dani...um dia tocou o telefone na minha casa aqui no Rio. Era ela. Fiquei feliz por alguns momentos, até perceber que o que ela queria era que eu arrumasse uma casa em Búzios para ela ficar de graça com o namorado. Vendo que do mato não saía cachorro, desligou sem mais delongas. Não fazia questão de marcar um reencontro. Tudo bem: sei que sou meio fanática por essa história de reencontrar pessoas que nem lembram mais que eu existo.

O assédio masculino inexistia fora do ginásio do Tarumã, mas a universidade me rendeu uma fã inesperada, que deixava bilhetes apaixonados, poesias e até uma flor no vidro do carro. A moça, que eu nunca soube quem era, só desistiu depois que uma amiga dela que ligou para a minha casa ouviu em alto e bom som que sim, eu tinha namorado e não, eu não gostava de mulheres. 

Assim como ela, praticamente todos sumiram. Bernardo, que me perseguia pela faculdade e a quem eu carinhosamente chamava de "meu ET", às vezes dá sinal de vida, assim como Carol, que eu levei ao Pão de Açúcar quando esteve no Rio, há quatro anos. Tatiane, Kamila, Fábio, Amanda, Rubens, Karina - esses nunca mais vi. Talvez, se eu tivesse e-mail na época, teria mantido contato. Talvez não.

Como me disse Andrea, a bela gaúcha, certa vez: "Rê, tu sabe que tu vai fazer amigos sempre, não importa onde tu estiver. Mudar é sempre bom, tu sabe, tu vive mudando....Só, que, quando casar, não mude de marido!" Esperta, a Andrea. Seguiria todos os seus conselhos, exceto o tal da porta aberta. 

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